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W. W. Denslow
Totó era originalmente um cão Cairn Terrier
Desperta Dorothy com o choque da casa pousando no solo, tão
brusco e repentino. Não fosse a maciez do colchão, teria se machucado. Totó,
que dormia esparramado ao longo do leito, salta para o assoalho latindo.
- Psiuuu! – expressa Dorothy, meio
espantada.
Senta-se na cama, desconfiada. Mas logo
fica encantada com um risco de luz do sol, entrando pela fresta da janela. Pula
para o chão. Abre a porta e depara com uma bela paisagem na sua frente.
- Meu deus, é o paraíso!... Ai, nem acredito no que estou vendo.
Era mesmo uma visão maravilhosa diante
dos seus olhos!... Logo na porta de casa descia um pomar de dar água na boca,
produzindo laranjas, goiabas, pêssegos e jabuticabas. Abaixo, reluzia um riacho
sereno, cortando extenso campo florido. Um sonho!... Dorothy, acostumada com a
planície seca, desértica e cinzenta do Kansas, se deslumbra com o colorido das
flores, o canto dos pássaros e o sussurro melodioso das águas do regato.
Enquanto admirava a beleza do lugar,
avista quatro anões que vinham ao seu encontro. Totó começa a latir. Dorothy
ralha com ele:
- Psiu!... Quieto, amor.
O cão obedece e fica da porta, com os
olhinhos pretos bem atentos, espreitando aquela gente esquisita: três velhos e
uma mulher de cabelos grisalhos, trajando uma túnica estampada com estrelinhas
que faiscavam ao sol. Todos usavam chapéus redondos terminando em bico, com
mais de trinta centímetros acima da cabeça. Dependurados nas abas, um monte de
sininhos que tilintavam ao menor movimento.
Sorrindo, a mulher faz reverência a
Dorothy:
- Bem-vinda à Terra dos Anões, ilustre
Bruxa!
Dorothy assustada, dá dois passos atrás.
- Aham! O quê?!...
- Não se acanhe. Parabéns por ter
acabado com a Bruxa Malvada do Leste. Seu gesto de coragem libertou nosso povo
da escravidão.
A garota, ainda sem entender:
- Eu!... Deve haver engano, minha
senhora. Nunca matei nem um mosquitinho de nada!
- Não há engano nenhum.
- Juro. Não matei ninguém. Nem sou
Bruxa.
- Bem, se não foi você, foi sua casa. Dá
no mesmo.
A velha anã insiste:
- Veja, existem dois pés aparecendo por
baixo daquela viga que sustenta a casa.
Dorothy arredonda os olhos de espanto.
- Santo Deus!... Quem é?
- A Bruxa Malvada do Leste – repete a
mulher.
- Trem esquisito!... Não tenho culpa,
foi um acidente. A casa caiu em cima da coitada. Mas...
- Não se preocupe. Ela era má. Dominou
os anões por longos anos. Livres, querem agradecer a você.
- Quem são eles?
- Os habitantes desse lugar.
- A Senhora é a rainha deles?
- Não, apenas amiga. Ao saber da morte
da Bruxa Malvada do Leste, corri para cá. Sou a Bruxa do Norte.
- Bruxa!... Bruxa de verdade?
- Sim. Mas, sou uma Bruxa boa. O povo me
adora.
- Se é boa não é bruxa, é uma Fada.
- Prefere me chamar assim?
- Ã-hã.
- Sou pouco menos poderosa do que a
Bruxa Malvada, que acaba de morrer. Agora, existe apenas uma Bruxa má na Terra
de Oz.
- Sério?
- Sério.
- Cadê a outra? – quis saber Dorothy.
- Vive muito longe daqui. É a Bruxa
Malvada do Oeste.
- Ela é tão má assim?
- Nem lhe conto!
- Quantas Bruxas boas ainda existem por
aqui?
- Duas. A Bruxa do Norte e a do Sul.
- Que bom que você é uma delas.
- Sim – responde a outra com uma pitada
de orgulho.
Dorothy pensa um pouco e revela:
- Engraçado!... Tia Ema sempre me disse
que as bruxas más morreram há muito tempo.
- Quem é tia Ema?
- Mora no Kansas, o lugar de onde venho.
- É uma terra civilizada?
- Sim, senhora
- Ah, então é por isso!... Nos lugares
civilizados não há mais bruxas, nem fadas. Muito menos mágicos, ou feiticeiras.
- Mágico eu garanto que tem – se apressa
a menina.
- Aposto que não são verdadeiros.
Mágicos de circo são mágicos de mentirinha, só para enganar.
- É?
- No Reino de Oz, sim, ainda há bruxas e
mágicos de verdade. Oz é o mais poderoso de todos. Habita a Cidade das
Esmeraldas.
Dorothy ia fazer uma pergunta, quando um
dos anões grita e aponta o dedo para a casa.
- O que foi? – apressa a Bruxa, curiosa.
- A Bruxa Malvada do Leste desapareceu –
mostra o homenzinho.
A Bruxa do Norte dá uma gargalhada:
- Coitada!... Era tão velha que logo se
evaporou no ar. Ficou apenas seu par de sapatos de prata.
Assim falando, ela caminha até a Bruxa
morta. Recolhe os calçados, sopra a poeira e os entrega a Dorothy, dizendo:
- Agora, minha pequena, eles são seus.
Podem ser úteis um dia.
- São poderosos, viu? – interveio um dos
Anões.
A garota agradece o presente e leva os
sapatos de prata para dentro da casa. Retorna num instante e pergunta:
- Podem me ajudar a encontrar o caminho
de volta para casa? Tia Ema e tio Henry, sozinhos no mundo, devem estar
preocupados comigo.
Os anões e a Bruxa entreolham-se,
balançando negativamente a cabeça. Um deles garante:
- Impossível atravessar o deserto pelo
leste.
- A mesma coisa acontece no sul – alerta
o outro.
- Ao norte fica minha região – explica a
Bruxa. O deserto é tão grande e quente que impede qualquer um de chegar ao
outro lado.
- Meu Deus!...
- A oeste, também não dá. A Bruxa malvada
faria de você escrava para sempre – previne o terceiro anão.
Pausa. Bruxa do Norte:
- Você poderia viver com a gente –
sugere a Bruxa, rindo.
- Não posso, preciso voltar ao Kansas –
lamenta a menina.
- Então por que veio parar aqui?
- Conhecer
lugares, pessoas e culturas são alguns bons motivos para se planejar uma
viagem, mas não foi o meu caso. Estou aqui por força de um ciclone que me
arrancou do lugar que eu morava e me trouxe para cá com o Totó.
- Entendo.
Dorothy, como se
atingida por um novo ciclone, começa a soluçar com medo de não poder voltar
para casa. Suas lágrimas comovem os anões.
- Não chore, garota – pede um deles em
tom de consolo. - Acho que a Bruxa do Norte pode ajudá-la. Adora tanto as
crianças que, em nossa cidade, quando passa pelas ruas nossos filhos correm
para ela. Gostam de receber o carinho de suas mãos macias e ouvir de seus
lábios historinhas encantadoras do mundo encantado das bruxas.
A Bruxa bondosa, também comovida, começa
a andar de um lado para o outro com as mãos entrelaçadas atrás das costas. De
repente, para. Puxa a ponta do chapéu para junto do nariz e começa a contar:
- Um!... Dois!... Três!...
Surpreendentemente seu chapéu vira um
quadro negro. Onde se lê:
MOSTRE A DOROTHY O CAMINHO DA CIDADE DAS
ESMERALDAS
A Bruxa retira o quadro do nariz. E
pergunta:
- Seu nome é Dorothy?
- Sim – confirma a menina, enxugando as
lágrimas com a manga do vestido.
- O Mágico de Oz pode ajudar você a
voltar para casa.
- Quem é mesmo Oz?
- Um mágico poderoso, o rei da Cidade
das Esmeraldas.
- Como posso chegar lá?
- Caminhando por aquela estrada
pavimentada de pedras amarelas – mostra a Bruxa.
- A senhora vai comigo?
- Não, não posso. Mas, vou protegê-la.
Fique tranquila. Ninguém lhe fará mal.
- O caminho é perigoso?
- Um pouco. Mas...
A Bruxa toma Dorothy pelos braços e
dá-lhe um beijo, deixando a marca redonda e cintilante na sua testa. E ensina:
- Quando encontrar Oz não tenha medo nem
banque a boba. Conte-lhe a sua história e peça ajuda. Boa sorte! Adeus,
querida!
Mal acaba de falar, rodopia três vezes
sobre o pé esquerdo e desaparece no espaço. Os três anões se despedem também,
saindo em disparada. Totó late bem alto. Dorothy acha normal a bruxa
desaparecer daquele jeito. Nas historinhas isso acontece.
E, por um momento, pensa lá com seus
botões: desembarcar só com o Totó, em um lugar
tão estranho, parece à primeira vista, um pesadelo. Mas, pelo que estou vendo,
pode ser uma aventura fantástica!... Quantas surpresas podem ter até chegarmos à Cidade das
Esmeraldas?
* FBN© - 2013 – O Papo com os
Anões – Cap. 02 de O MÁGICO DE OZ – Adaptação livre do original por: Welington
Almeida Pinto - Categoria: Prosa Infanto-Juvenil – Texto original em português
- IIustr.: Capa de edição do século XX – Link: http://omagicodeoz.blogspot.com.br/2005/03/o-papo-com-os-anes.html
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02 –
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