Quando Dorothy acordou, o sol ia alto.
Totó perseguia os pássaros e os esquilos, se divertindo como nunca.
- Precisamos buscar água – lembra
Dorothy.
- Para quê? – pergunta o Espantalho.
- Uai!... Para beber. Lavar o rosto,
também.
- Ainda bem que não preciso disso.
– Nós de carne e osso, sim. Precisamos
comer uma comida saudável, dormir um bom sono e beber água potável todo dia.
- Potável!... O que é isso?
- Água limpa e pura, própria para o
consumo.
- Bem, então vamos a busca de água para
você e o Totó.
Imediatamente, os três deixam a cabana e
andam pela floresta até encontrar um regato de água límpida. Dorothy lava o
rosto, escova os dentes e senta-se numa pedra para merendar com Totó. De
repende, escuta um gemido agonizante.
- Que será isso? – pergunta a menina,
apreensiva.
- Nem imagino, parece que vem daquele
lado.
Escutam outro gemido, mais dolorido.
- Vamos lá para averiguar – dispõe
Dorothy.
Totó sai na frente, latindo. A menina e
o Espantalho seguem atrás. Poucos metros adiante avistam um homem deitado ao
lado de uma árvore tombada. Aproximam-se e viram que ele era feito de lata e
estava completamente imóvel, segurando numa das mãos o machado, como se
estivesse encantado por uma bruxa.
- Bom dia, rapaz – cumprimenta Dorothy.
- Bom dia, menina – responde o Homem de
Lata, gentilmente.
- Você que gemeu ainda a pouco?
- Sim. Há mais de um ano faço isso, mas
ninguém aparece para me socorrer.
- Podemos ajudá-lo?
- Pode, sim. Busque a lata de óleo na
minha cabana e lubrifique minhas juntas, estão enferrujadas. Depois disso,
ficarei bom novamente.
Dorothy corre à casa do homem de lata,
justamente, onde passou a noite com o Espantalho e Totó, e volta com a lata de
óleo.
- Começo por onde? – pergunta.
- Pelo pescoço – pede o homem de lata.
A menina lubrifica todas as articulações
do seu pescoço. Estava tão emperrado que o Espantalho foi obrigado a pegar a
cabeça do homem de lata, movê-la lentamente de um lado para o outro, até voltar
a funcionar sozinha. Em seguida, foi a vez das juntas dos braços e das pernas.
Livre da ferrugem, o homem de lata
suspira com alívio:
- Obrigado. Sem ajuda de vocês, passaria
o resto da vida nesse lugar, totalmente imobilizado.
- Não se preocupe. Faríamos isso para
qualquer um numa situação desta.
- Belo gesto, menina. Qual o seu nome?
- Dorothy. E o seu?
- Quando era de carne e osso, chamava
Tonhão. Depois que fui reconstruído com folha de flandres, o pessoal começou a
me chamar de Homem de Lata.
- Então era de carne e osso?
- Ã-hã.
- Aposto que foi encantado pela bruxa
má!
- Mais ou menos. Depois, eu explico como
aconteceu para vocês.
- Adoro ouvir histórias.
- Pois então, Dorothy, vai gostar de
minha. Agora, me conta o que fazem por aqui?
- Vamos à Cidade das Esmeraldas para falar
com o grande Mágico de Oz.
- Para quê?
- Quero voltar ao Kansas. O Espantalho
vai pedir um cérebro a ele.
O Homem de Lata, depois de pensar um
instante:
- Não tenho coração. Será que Oz me
daria um?
- Acho que sim. Seria tão fácil como dar
cérebro ao Espantalho.
- É verdade! – concorda o Homem de Lata.
– Posso acompanhá-los?
Depois de ficar um
instante em silencio, surpreendida com a pergunta, Dorothy responde:
- É claro.
E sem esperar a
opinião do Espantalho, ela emenda:
- Vai ser bom ter
mais um em no nosso grupo. A união faz a força, não é mesmo?
Totó rosna mostrando certo ciúme. E o
boneco de palha balança a cabeça, anuindo.
O Homem de Lata agradece. Apoia o
machado no seu ombro e os quatro partem para a Cidade das Esmeraldas numa
conversa animada. Não andaram muito e o Espantalho leva o primeiro tombo do
dia, tropeçando numa pedra no meio do caminho.
- Por que não pulou a pedra? – quis
saber o novo companheiro de jornada.
- Não tenho cérebro. No lugar dele,
apenas palhas. Por isso não raciocino direito.
- Ah, é!...
- Espero ganhar um cérebro de Oz.
Pausa. O Homem de Lata:
- Para mim, cérebro tem pouca
importância.
- Isso porque você deve ter um bom
cérebro – apressa o Espantalho.
- Não. Minha cabeça é completamente oca.
Mas já tive cérebro e coração. Por ter experimentado os dois, prefiro mil vezes
o coração.
- Uai, por quê?
- É uma longa história.
- Prometeu contar para nós – recorda
Dorothy.
- Sim, já que insistem. Sempre fui uma
criatura de espírito rústico e selvagem, filho de um casal de lenhadores. Com esse
temperamento forte só a longo prazo é que conseguia agradar aos outros, mesmo
assim se quem me contemplava tivesse ao menos um grão de indulgência.
- É mesmo? – pergunta
Dorothy, surpresa.
- Foi o que
aconteceu com uma bonita jovem da minha aldeia. Rapaz novo e inquieto logo me
apaixonei pela donzela. E, como vi que ela também ficou caída de amores por mim, combinamos casar o mais
rápido possível. Mas, quando ela disse à sua velha patroa, com quem trabalhava
há muitos anos, que ia se casar e mudar para outra cidade, o pior aconteceu.
- Aconteceu o quê? – pergunta o
Espantalho preocupado.
- Vendo que a criada ia sair de sua
casa, a senhora procurou a Bruxa Malvada e ofereceu duas ovelhas e uma vaca
para impedir nosso casamento.
Nesse ponto da história, o Homem de Lata
faz uma pausa, como se estivesse colocando as ideias em ordem. E continua:
- Não deu outra, a Bruxa Malvada
enfeitiçou meu machado. Um dia, quando trabalhava, a ferramenta escapuliu de
minhas mãos e cortou-me a perna esquerda. Tive que ir a um funileiro para
improvisar outra perna. De lata, é claro. Ficou tão boa quanto de carne e osso.
A Bruxa, ao saber da nova perna, não se conteve e me castigou de novo.
- Como assim? – pergunta Dorothy,
ansiosa.
- Acreditem!... Mal voltei ao trabalho, da
mesma forma o machado decepou minha perna direita – o funileiro outra vez
quebrou meu galho. Depois, fiquei sem os braços – mais uma vez o funileiro
colocou em mim braços de lata.
E depois de um suspiro:
- Mesmo assim, acham que a Bruxa Malvada
me deixou em paz?
Ele mesmo responde:
- Minha filha, a Bruxa não me dava
trégua. Tiririca de raiva ordenou ao machado que me arrancasse a cabeça e partisse
meu corpo em pedaços. Pela quarta vez, o bom funileiro me reconstituiu tudo em folha
de flandres.
Dorothy admirada:
- Impressiona-me a habilidade desse
funileiro!
- Um gênio. Como sabia que o corpo
humano é uma máquina desenhada para os movimentos, ele dotou-me de dobradiças
ligadas a centenas de fios resistentes e elásticos, que fazem o papel dos
músculos. É esse sistema de alta
complexidade que permite deslocar meu corpo para qualquer direção. Entende?
- Entendo.
- Mas, para a minha tristeza, ele não
fez coração! Sem coração, perdi todo o amor pela minha namorada. Então,
desmanchei o noivado.
Dorothy leva uma das mãos à boca,
admirada:
- Você perdeu uma das coisas mais
importantes da vida, o amor. Sem ele, é como se você tivesse um corpo sem alma.
O Homem de Lata abaixa a cabeça,
dizendo:
- Você tem razão. Por outro lado, passei
a sentir orgulho do meu novo corpo de metal. Agora, resistente ao golpe de
machado e, em dias de sol, brilha que é uma beleza.
- Legal.
- Hoje, só temo a ferrugem. Alerta
máxima!... Por isso, ando
sempre com uma lata de óleo para lubrificar minhas juntas.
- Por que quer um coração?
- Ora!... Pretendo me apaixonar de novo
– afirma Homem de Lata, irradiado por uma alegria súbita.
Dorothy, com olhinhos úmidos, fica toda emocionada
com a história que acabara de ouvir.
* FBN© - 2013 – O Homem de Lata–
Cap. 05 de O MÁGICO DE OZ – Adaptação livre do original por: Welington Almeida
Pinto - Categoria: Prosa Infanto-Juvenil – Texto original em português - IIustr.: – Link: http://omagicodeoz.blogspot.com.br/2005/03/o-homem-de-lata.html
- 05 -
2 comments:
Adoro o Mágico de Oz... sou apaixonada!
O meu favorito é justamente o homem de lata.
Adorei este teu post.
tudo de bom!
ass: Larinha.
É lindo, chorei lendo. Passe no meu blog: www.palavrasdefato.blogspot.com
Beijos
Post a Comment