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Ilustração Original, 1900.
Imagem da Internet
Dorothy toca a sineta. O Guardião abre a
grande porta, surpreso.
- O quê?!... Estão de regresso?
Dorothy, rindo:
- O que há de errado?
- Pensei que tivessem ido às Terras da
Bruxa Malvada do Oeste.
- Acabamos de voltar de lá.
- Uai, como escaparam da Bruxa?
- Ela derreteu-se – esclarece o homem de
palha.
- Derreteu-se?
- Como num passe de mágica, a malvada
evaporou-se, entende?
Sumiu no ar.
- Como assim?
- Coisa de Dorothy! – adianta o Leão.
- Santo Deus! – exclama o guarda, já
fazendo reverência à garota. - Ótima notícia, garota.
- Para você ver como são as coisas! –
aplaude o Espantalho todo sorridente.
–
Podem me contar isso direito?
- Isso é história para outra hora –
interfere a garota. - Primeiro, nos leva ao Grande Mágico.
- Garota, preciso saber mais sobre esse
acontecimento fabuloso – insiste o Guardião, verde de curiosidade.
- Depois.
- Mas é verdade, a Bruxa sumiu no ar
mesmo, escafedeu-se – confirma o Espantalho.
- Custo acreditar!
Boquiaberto com a façanha, o homenzinho
de barba verde imediatamente coloca os óculos verdes em cada um, tal como havia
feito anteriormente, prometendo levá-los ao Grande Mágico.
Ao chegarem ao Palácio, de novo, a bonita
jovem verde conduz os forasteiros aos seus respectivos quartos para descansar e
aguardar o dia em que o Grande Oz pudesse recebê-los.
Oz, ao saber que os viajantes estavam de
regresso por terem eliminado a Bruxa Maligna, não fez nenhum comentário, muito
menos marcou o dia da entrevista. Dorothy e os companheiros ficam intrigados
com a indiferença do Mágico. Três dias mais tarde, cansados e aborrecidos de
tanto esperar, o Espantalho perde a paciência e manda um recado curto e grosso
a Oz: caso não fossem atendidos, ele chamaria
os Macacos Alados para obrigá-lo a cumprir as promessas.
Quando o Mágico recebe a mensagem leva
um grande susto. Diante da ameaça, imediatamente, manda dizer a eles que, às
nove horas da manhã seguinte, iniciaria o encontro com todos os visitantes.
Mal amanhece o dia, Dorothy e os amigos
já estavam acordados e animados para o encontro com o Grande Mágico. Nove em ponto o soldado de barba verde foi
buscá-los e, poucos minutos mais tarde, entram todos no Salão do Trono,
inclusive Totó. Cada um mais curioso do que o outro para ver como o Mágico se
apresentaria. Para surpresa geral não havia ninguém no salão, mas do teto logo
desceu uma voz imponente:
- Sou Oz, o Grande e Terrível!... Que
querem de mim?
Dorothy começa a olhar para todos os
lados, abismada.
- Onde está você? – pergunta.
- Em toda parte – respondeu a voz. – Sou
invisível para os olhos dos mortais comuns. Agora, irei sentar em meu trono
para que possam conversar comigo.
- Assim é melhor. Viemos pedir que cumpra suas promessas –
adianta Dorothy.
- Que promessas?
- Mandar-me de volta para o Kansas,
assim que a Bruxa Malvada do Oeste fosse destruída.
- A mim, prometeu um cérebro – lembra o
Espantalho.
- A mim, um coração – reclama o Homem de
Lata.
- E a mim, muita coragem – urra o Leão
Medroso.
Oz altera a voz:
- Estão certos de que a Bruxa foi
realmente destruída?
- Claro que sim. Eu mesma dissolvi a
infeliz com um balde de água – esclarece a garota.
- Boa notícia que me traz. Parabéns. Mas
tenho que pensar sobre o assunto. Voltem amanhã.
- Mais tempo? Teve tempo de sobra, meu
caro! - bronqueia o Leão.
- Só mais um dia. Eu prometo.
- Não. Não. Você já teve muito tempo –
repete o Lenhador, inquieto.
O Espantalho dá um passo à frente:
- Tudo bem!... Só mais um dia, caso contrário,
os Macacos Alados poderão nos ajudar a resolver essa questão, certo? Não
queremos esperar mais.
- Podem confiar.
O Leão Medroso, só para dar um susto ao
Mágico, solta um rugido tão alto e longo, que Totó dá um pulo para trás e
derruba o biombo num canto da Sala, fazendo um barulho danado. Todos olham para
trás e ficam espantados ao ver que o tapume escondia um velhinho calvo, rosto
enrugado, barba e bigodes por fazer, metido num grosso capote de lã e, calçando
sapatos de lona verde, tão espantado quanto eles.
O Homem de Lata levanta o machado,
pronto para atacar:
- Quem é o senhor?
- Sou Oz, o Grande e Terrível – responde
o homenzinho com um sorriso amarelo.
- Não pode ser! – murmura Dorothy, mal
acreditando no que via.
– Por favor, não me machuquem. Farei o
que quiserem.
Dorothy, desapontada:
- Pensei que Oz fosse uma cabeça enorme!
- E eu, uma linda Princesa! – entristece
o Espantalho.
- Ainda bem que não é uma fera! -
resmunga mais aliviado o Homem de Lata.
- E eu acreditei que Oz era uma Bola de
Fogo! – rosna o Leão.
O velhinho recua um pouco, encafifado. Ao
se ver em tamanha enrascada, seus olhos ficaram acesos como duas brasas, um
sorriso amargo bailou nos lábios e o desejo de sumir correu-lhe como um raio pelo
corpo todo. Mesmo assim, furioso dentro de si, porém sorrindo, admite com
humildade:
- Enganei a todos. Eu sinto muito, perdoem-me.
- Então não é o grande mágico? – inquire
Dorothy.
- Essa é a grande pergunta.
- Vamos, fala.
- Pssssiu! Pssssiu! Fale baixo, menina,
ou estarei arruinado. Aqui todos acreditam que sou o Grande Mágico.
Um lobo ruge dentro
do espantalho:
- É ou não é?
- Bem!... Aprendi alguns truques –
confessa o velho, estalando a língua de nervoso.
- Um impostor, fazendo todos nós de bobo!
– vocifera o Lenhador, cuspindo óleo de raiva e o machado suspenso ar.
E mais nervoso ainda, aproxima-se de Oz,
condenando:
– O que está feito está feito, já era.
Agora, acabou a moleza, velho idiota! Aqui se faz
aqui se paga.
- Calma, calma – pede apavorado o
impostor.
- Só preciso de um mínimo de raiva
para entrar no clima e acabar com você, viu?
Oz retrocede mais um pouco e torna a
estalar a língua:
- Não sou mais do que um homem comum. Podemos
conversar, o diálogo é o melhor remédio para se chegar a um acordo, certo?
Dorothy, cada vez mais confusa, fuzila
Oz com um olhar inquisidor.
- Como me apareceu sob a forma de
cabeça?
- Já disse, conheço os truques -
responde Oz, com o olhar cada vez mais inquieto.
- Ora essa, então nos fez de bobos? –
pergunta irritado o Espantalho.
- Posso explicar tudo, tin-tim por tin-tim.
- Queremos ver, mágico de uma figa. Caso
contrário... – intimida o Leão.
- Sigam-me, por favor.
Oz, mesmo nervoso de tanto medo, ergue a
cabeça e conduz o grupo a um quarto, atrás da Sala do Trono. A primeira coisa
que eles viram foi a imensa cabeça feita de papelão, abandonada num canto.
- A cabeça ficava pendurada no teto.
Atrás do biombo eu manipulava os fios para fazer mover os olhos e a boca –
explica o homenzinho.
- E a voz?
- Sou ventríloquo. Jogo o som da minha voz
para onde quiser.
- Trem danado! – admira o Espantalho.
O falso Mágico mostra-lhes o vestido e a
máscara que usou para se transformar numa linda princesa. No outro canto do
quartinho, viram que a fera horrível não passava de um monte de peles, costuradas
umas às outras numa estrutura de arame. A bola de fogo, nada mais era do que
uma grande bola de algodão, embebida em óleo de mamona, queimando intensamente.
Dorothy e os amigos, em silêncio, ficam
pasmos diante daquele inteligente aparato feito para enganar as pessoas.
- Francamente, deveria se envergonhar de
ser um vigarista - recrimina o Leão.
- Ah, sim. Tenho vergonha, é claro. Mas
era a única coisa que poderia fazer. Sentem-se, por favor. Escutem a minha
história.
Interessados, cada um se acomoda nos
tamboretes espalhados pela sala. De pé, Oz começa a contar:
- Nasci na cidade de Omaha, localizada
no estado americano do Nebraska. Muito longe daqui, mas o Condado de Douglas
não é tão longe assim do Kansas.
Dorothy até ensaia um sorriso. O velho continua:
- Comecei a ganhar a vida como
ventríloquo, apresentando espetáculos com bonecos. Com o tempo, aprendi a fazer
algumas mágicas e passei a trabalhar num circo de picadeiro, tirando coelhos e
pombos da cartola. Nas horas de folga, eu era balonista.
- Como assim?...
- Isso mesmo, menina: balonista. De cima
de um balão, anunciava o espetáculo na cidade.
- Ah, sim! – entende Dorothy.
- Certo dia, as cordas que prendiam o
balão ao solo arrebentaram e, sem poder baixar, uma corrente de ar me levou para
muito longe. Durante um dia e uma noite viajei sem destino, até que na manhã
seguinte pude ver que a aeronave voava sobre uma região muito bonita. Por fim,
ele pousou numa terra ensolarada, onde fui recebido por um povo de sorriso
largo que, me vendo descer das nuvens, imaginou que fosse um grande mágico.
- Nossa!... E aí? – interrompe Dorothy
outra vez.
- Não desmenti, é claro. Foi até bom.
Uma vez no lugar, otimista por natureza, aquietei-me. Pude me persuadir de que
não tinha nada a fazer, a não ser jogar a semente do entusiasmo ao solo daquela
rica região, torcendo para germinar, crescer, dar frutos e acumular fortuna, até
porque ninguém vence sozinho, não é mesmo? Enfim, a relação de anos com
aquela gente estava só no começo.
Depois de um breve suspiro, Oz continua:
- A partir daí, essa gente começou a me
adorar como se fosse um ser especial, cheio de poderes mágicos. Um rei. Logo, sob
o meu comando, construíram a Cidade das Esmeraldas e esse fabuloso palácio,
onde passei a morar. Sendo o verde a cor da esperança, e minha tonalidade predileta,
decretei que todos os habitantes usassem óculos de lentes verdes, para que as
coisas lhes parecessem sempre verdes.
- Então, nem tudo aqui é verde?
- Bem, menina!... Isso é outro truque:
quem usa óculos de lentes verdes, tudo que vê lhe parece verde, não?
- Meu Deus!... Você é mesmo um senhor
farsante!...
- Sou bom para o povo. Sou
compreensível, todos aqui gostam muito de mim.
- E por que não aparece para eles?
- Faz parte do jogo. Pensei manter
mistério para favorecer a imagem fantástica de Oz. Temia as Bruxas, principalmente
as do Oeste e do Leste. Elas poderiam me destruir a qualquer momento.
Felizmente você acabou com as duas.
- Então, cumpra a promessa e me faça
voltar para casa.
O Mágico revira os olhos:
- Também estou preocupado. Agora que vocês
sabem que não sou mágico tão poderoso, não sei como cumprir minhas promessas.
- Ah! Isso é que vamos ver, seu cabeça
de bagre! – vocifera o Homem de Lata com
o machado nas mãos.
Oz treme dos pés à cabeça. Sorri, sem
vontade e tenta se defender, dizendo:
- Oh, não, minha gente!... Apesar de
tudo, sou um homem bom.
- Quer dizer que não me dará um cérebro?
- lamenta o Espantalho.
- Para quê? Adquirimos conhecimentos com
a experiência da vida – afirma Oz, ensaiando um sorriso maroto.
- Sem cérebro, nunca serei feliz.
Após pensar um pouco, o falso mágico
olha para o boneco com ar de quem estava muito comovido.
- Tudo bem, amigo. Volte amanhã que
rechearei sua cabeça com um cérebro. Mas, como usá-lo, terá que descobrir
sozinho.
- Melhor assim.
- E a minha coragem?
- Meu bom Leão, eu estou seguro que lhe
sobra coragem. Falta-lhe apenas confiança em si mesmo. Não há criatura nesse
mundo que não sinta temor diante do perigo, pode crer. O medo faz parte da vida
de quem teme o risco.
- Pois fique sabendo que nunca serei
feliz se não me arranjar bastante coragem.
- Muito bem, fique tranquilo que amanhã
cuidarei do seu caso – repete Oz.
- E o meu coração?
- Bobagens, meu caro Homem de Lata!
Coração, no mundo de hoje, essa peça só traz infelicidade.
- Mesmo assim, eu quero o coração
prometido. Desculpe-me, assunto encerrado.
- Tudo bem. Amanhã vou arranjar-lhe um
coração de verdade.
O Homem de Lata balança a cabeça,
concordando. Dorothy, mais do que depressa:
- E como voltarei ao Kansas?
- Pensaremos sobre isso amanhã –
assegura o homenzinho.
- Mas...
- Sossega, minha filha. Vamos estudar e
descobrir a melhor maneira de atravessar o deserto. Amanhã, garanto, todos
ficarão satisfeitos com meu trabalho. Mas, por favor, não contem a ninguém que
sou um impostor.
Todos balançaram a cabeça, concordando.
Retiram para seus quartos, acreditando que Oz não era tão mau assim, iria achar
meios de satisfazer cada um dos viajantes.
* FBN© - 2013 – O
Mágico que não era Mágico – Cap
15 de O MÁGICO DE OZ – Adaptação livre do original, editado no ano de
1900, por: Welington Almeida Pinto -
Categoria: Prosa Infanto-Juvenil – Texto original em português - IIustr.:
Imagens da Internet Link: http://omagicodeoz.blogspot.com.br/2005/03/o-mgico-que-no-era-mgico.html
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